Desinformaçao | As duas Dilmas na imprensa, a federal e a da agua em SP

A Dilma da agua

Luciano Martins Costa no Observatorio da Imprensa

Os jornais desta 6a feira, 11, trazem à luz o perfil até entao discreto da presidenta da Sabesp, a Companhia de Saneamento Básico do Estado de Sao Paulo, empresa de economia mista responsável pelo fornecimento de água e coleta e tratamento de esgotos em 363 municípios paulistas. Sua intervençao no debate sobre a crise no abastecimento, que ameaça deixar sem água os moradores da regiao metropolitana de Sao Paulo, parece fazer parte de uma nova tática de comunicaçao, até então centrada na figura do governador Geraldo Alckmin.

Em seu perfil oficial, Dilma Pena é citada como mestre em Administraçao Pública pela Fundaçao Getúlio Vargas e graduada em Geografia pela Universidade de Brasília. Está imersa na questao hídrica há muito tempo, tendo atuado em órgaos federais e ocupado a Secretaria de Saneamento e Energia do Estado entre 2007 e 2010, período em que também presidiu o Conselho de Administraçao da Sabesp, da qual se tornou diretora-presidenta em 2011. Portanto, tecnicamente, é a pessoa indicada para explicar a crise, apontar soluçoes ou assegurar que a populaçao nao será afetada pela falta dágua. Por que, entao, ela era mantida em segundo plano, enquanto o governador se expunha aos questionamentos da imprensa?

Até a entrevista coletiva concedida na 5a feira, 10, e publicada nas ediçoes desta 6a feira, ela era praticamente desconhecida – os arquivos registram apenas uma apariçao, em conversa com uma repórter do DCI – Diário Comércio, Indústria & Serviços, publicada no dia 31 de janeiro deste ano. Nela, curiosamente, a presidenta da Sabesp já alertava para a necessidade de a populaçao economizar água.

A súbita apariçao pública da administradora é tratada de maneiras diferentes pelos 2 principais jornais paulistas. O Estado de S. Paulo faz um relato mais burocrático, no qual  Dilma Pena fala exatamente o contrário do que disse ao DCI, procurando tranquilizar a populaçao ao afirmar que a “reserva técnica” no fundo do principal reservatório da regiao garante que nao vai faltar água até o fim do ano.

Já a Folha de S. Paulo mostra a personagem mais agressiva, visivelmente incomodada com a afirmaçao, feita publicamente por vários especialistas do setor, de que “o governo nao se preparou corretamente para a crise de abastecimento”.

Pode ser que a assessoria de imprensa do governo paulista tenha mantido dona Dilma Pena distante dos jornalistas porque ela nao tem o perfil adequado para lidar com sutilezas da comunicaçao. Ao afirmar, por exemplo, que “quem lê, quem estuda, quem se informa sabe que a Sabesp tem planejamento”, ela abre uma frente de conflito com seus críticos, sem contribuir objetivamente para esclarecer a populaçao. De qualquer forma, em sua primeira apariçao pública de maior impacto, a presidenta da Sabesp mostra um temperamento que lembra o da outra Dilma, a presidenta da República.

A brincadeira da hora está em comparar a forma como a imprensa trata as duas xarás. A Dilma de Brasília é citada até em briga de torcida. Já a Dilma da Sabesp deveria ter sido procurada mais vezes pelos jornalistas, que passaram estes meses ouvindo as platitudes do governador Geraldo Alckmin, quando o correto seria buscar informaçoes técnicas que permitissem ao cidadao entender a gravidade da crise.

Se é necessário economizar água, como declarou a presidenta da Sabesp no final de janeiro, o governo do Estado deveria ter iniciado uma campanha nesse sentido já naquela ocasiao. Se está tudo bem, é preciso questionar a apreensao que vem sendo produzida pelo noticiário. Nao passa um dia sem uma fotografia nos jornais mostrando a reduçao dos níveis das reservas que servem a regiao metropolitana.

Mas nesta 6a feira, a Folha de S. Paulo enche-se de pudores autonomistas e publica editorial com um título promissor: “Populismo líquido”. Entao, o leitor e a leitora atentos correm os olhos pelo texto, na certeza de que, finalmente, a imprensa paulista resolveu questionar seu governador.

Nas primeiras linhas, o editorial considera “compreensível” que, em período eleitoral, o governador paulista relute em reconhecer a possibilidade de haver racionamento de água, mas afirma que houve falta de planejamento, contradizendo a Dilma da Sabesp.

Mas logo em seguida, o editorialista acha espaço para incluir a outra Dilma no oratório, ao afirmar que a eleiçao também interfere na política federal de energia. Parece uma obsessao…

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