Rolezinho, happening, rave – o q anda acontecendo nos shoppings brs?

Por Luciano Martins Costa no Observatorio da Imprensa ediçao 781

A violência, em algumas de suas muitas formas, é um dos temas dominantes na imprensa na semana que se inicia. A brutal revelaçao de que o sistema carcerário do Maranhao nao é pior do que a maioria das outras prisoes brasileiras produz uma enxurrada de textos com as obviedades que se repetem a cada rebeliao. Voltam às páginas as mesmas opinioes sobre falta de investimento, lentidao da Justiça e ineficiência da reclusao como forma de coibir o crime.

A questao do sistema penitenciário já é, de si, bastante complexa. Entao junta-se ao tema geral a volta das chacinas, modalidade tipicamente paulista de lidar com a violência: suspeita-se que as 12 mortes ocorridas na cidade de Campinas em apenas 4 horas tenham sido produzidas por policiais militares, em represália pelo assassinato de um soldado, baleado numa tentativa de assalto.

Para completar o quadro, autoridades e administradores de shopping centers acabam por criminalizar a prática do “rolezinho”, espécie de happening cultural criado por adolescentes da periferia paulistana para suprir a falta do que fazer nas férias.

Os 3 eventos, reunidos nas ediçoes de ontem, 3a feira, demonstram a dificuldade que tem a imprensa para compreender certos fenômenos do nosso tempo. De resto, o espanto da mídia tradicional também reproduz a distância que se criou entre a sociedade brasileira e as entidades que deveriam representá-la.

Sao acontecimentos cujas raízes estao imbricadas entre si, e suas conexoes podem ser pesquisadas no noticiário dos jornais. Nos presídios paulistas, a onda de motins e assassinatos que perturbaram o mandato do falecido governador Mário Covas foi “resolvida” em 2002, com a eliminaçao física de líderes de facçoes criminosas e a entrega do sistema penitenciário ao grupo conhecido como /// Primeiro Comando da Capital.

A consolidaçao do poder do PCC nas comunidades pobres, de onde o Estado se retirou há décadas, deixa os jovens à mercê do arbítrio dos bandos de criminosos e de policiais corruptos ou despreparados. Quando saem de seus guetos, esses jovens sao vistos como ameaça.

O quadro é complexo mas pode ser compreendido à luz das desigualdades sociais. Evidentemente, os analistas conservadores hao de considerar que qualquer referência à perversidade do sistema social é parte do palavrório esquerdista que tenciona demonizar o capitalismo, mas nao se pode fugir às evidências de que a presença de qualquer grupo com mais de 3 jovens da periferia deixa nervosos os seguranças dos centros de compras ou os policiais que fazem a ronda na Avenida Paulista. Sem opçoes de lazer em suas comunidades, esses protagonistas da cena urbana têm que ir a algum lugar para exercer sua sociabilidade.

O evento específico do “rolezinho” é filho do happening criado por artistas plásticos nos anos 1960. O sistema de convocação pelas redes sociais tem origem nas festas rave de Londres, prática iniciada nos anos 1990, quando os jovens começaram a ocupar espaços públicos e privados para encontros musicais quase clandestinos, depois que esse tipo de evento foi limitado pelas autoridades inglesas. Com o advento das redes sociais e a popularizaçao dos telefones celulares com acesso à internet, a convocaçao dessas reuniões se torna mais fácil e imediata.

Qual é a diferença entre marcar um encontro coletivo num shopping e juntar mil pessoas dispostas a tirar a roupa num parque para aparecer numa fotografia? O que diferencia essas práticas é a expectativa de que toda reuniao de jovens de baixa renda vai degenerar em saques, depredaçao e violência. Num dos casos, a autoridade irá providenciar segurança para que os participantes nao sejam perturbados. No outro, vai tratar todos como bandidos.

Nao se pode esperar que os analistas referendados pela mídia tradicional, ou pelo menos a maioria deles, conduza o debate para a questao da violência institucional, que vai da arbitrariedade policial aos mal dissimulados preconceitos que ainda marcam as relaçoes sociais no Brasil.

Interessante observar também que os protagonistas dos “rolezinhos” sao parte da nova classe de renda média, cujo poder de consumo sustenta o andar de cima da sociedade brasileira.

Acontece que sao quase todos meio escurinhos…

Todas sobre rolezinhos no Blue Bus

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